segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Deito-me no céu


Ilustração de Alan Baker
a
a
a
a
a
a
a
a
a
a
a
a
a
a
Entrego-me, deito-me no céu vazio, azul, intenso, aguado de mar e sal e lágrimas e areia que dói quando se esfregam os olhos...
Deito-me no vazio do céu, rasgando as nuvens, o vento, as correntes quentes e frias que me lambem o corpo e agarram, dilacerando e reabrindo golpes antigos. Que já conheço, que já sei como doem, que arrisco de novo em senti-los...
Desço numa estonteante viagem, que me acelera o coração e oprime-o com medo, tanto medo...
De não sentir as minhas asas a abrirem... de me aperceber em vão que porventura não as tenho.
E vou querer que me agarres com dedos firmes e mãos fortes, que vão saber a rochas que não se gastam com o vento. Rochas de aço e não de areia...
Nunca mais quero que me saibas a areia. Essa escorrega-me pelos dedos e nunca a consigo agarrar... ilusão de a prender, abrir as mãos e sentir o vazio, que me escorre, como o azul que me emprestas do teu olhar.
E depois que sofreguidão!... A querer-te dentro de mim, para sempre e sempre. Que sofreguidão em querer condensar-te num só dia, que seja vivido inteiramente para mim e por mim, mas também por ti. Porque o queres. Porque queres ser meu, sempre meu. Mas com uma loucura permanente e tão nossa, tão incompreensível para todo o resto.